Com uma leve pressão no mouse, o mundo nos observa com olhos curiosos enquanto nos expomos na grande tribuna global. Facebook, Orkut, Linkedin, twitter, YouTube, Blog, MySpace, MSN… Rede ou mídia social, essas ferramentas virtuais estão definitivamente imersas no nosso cotidiano. Já deixou scraps no Orkut para o amigo de infância que não via há dez anos, paquerou pelo Facebook, procurou trabalho pelo Linkedin, acompanhou, do trabalho, o que o filho fazia em casa pelo Messenger e assistiu à festa de aniversário do irmão pelo YouTube? Se fez uma dessas coisas, sim, você está plugado. E muitos de nós estamos.
É por essa razão que a sociedade começa a chegar ao consenso de que tamanha comunicabilidade deveria exigir responsabilidade à altura, porque a decisão de participar dessa gigante rede de contatos tem impacto sobre a vida das pessoas, principalmente no mundo do trabalho, onde uma informação divulgada de forma deturpada pode causar demissões e estragos financeiros. Uma responsabilidade que nem sempre alguns profissionais conseguem ter.
Como no caso do então diretor Comercial da Locaweb, que, no dia 30 de março, utilizou palavras agressivas no seu twitter para achincalhar o time do São Paulo durante um jogo contra o Corinthians. O curioso é que a empresa estava patrocinando o São Paulo nessa partida do Campeonato Paulista. A situação poderia ter passado despercebida se, no final, ele não tivesse postado o nome da empresa, o que poderia sugerir um comportamento condizente da Locaweb com a declaração do colaborador. A mensagem se espalhou rapidamente e ganhou as páginas de notícias. O resultado foi o desligamento dele do quadro de funcionários em comum acordo com a empresa, segundo informações de Guilherme Mazzolla, gerente de Comunicação da Locaweb e porta-voz sobre o assunto. “O próprio Alex Glikas decidiu desligar-se da empresa após o ocorrido”, afirma.
O que ocorreu na Locaweb foi apenas um caso dentre muitos que sempre despontam na mídia. Entre eles, há o de um brasileiro que se vangloriava em sua página no Orkut de furtar notas fiscais da empresa em que trabalhava. Ele foi demitido por justa causa, entrou com uma ação trabalhista pedindo reintegração ao emprego e indenização por danos morais. A desembargadora Edna Pedroso Romanini, doTribunal Regional do Trabalho, rejeitou os pedidos.
Um outro caso foi de um colaborador do setor têxtil que postou no YouTube um vídeo dando um cavalo de pau com a empilhadeira da empresa. Também foi demitido por justa causa, pediu reintegração ao emprego, mas a juíza Elizabeth Priscila Satake Sato, da 1ª Vara do Trabalho de Piracicaba, negou o pedido considerando que o colaborador usou a máquina de forma indevida durante o horário de trabalho.
Em todas essas situações, a empresa poderia ser prejudicada, e a demissão por justa causa entra como instrumento de defesa legal, considerando que não existe lei específica no Brasil sobre o uso dos meios virtuais – as mesmas regras contemplam as mesmas ferramentas eletrônicas, como e-mail, twitter, blogs etc. Segundo o advogado trabalhista Alan Sasson, sócio do escritório Valentim, Braga e Balaban Associados, a demissão por justa causa está prevista quando o colaborador descumprir alguma obrigação legal ou contratual.
Nos casos de má utilização de mídias e redes sociais, o argumento para o desligamento do colaborador é o mau procedimento em relação às regras internas da empresa. “O profissional é pego em conduta passível de justa causa”, diz. Sasson defende a criação de leis específicas sobre o assunto, mas que sejam abrangentes, porque as tecnologias passam por evolução de forma ininterrupta e é impossível que a Justiça siga esse ritmo. “Não há código de conduta de direito eletrônico, mas precisamos criá-lo para coibir de forma mais específica cada caso.”
Para o advogado, as empresas ainda caminham a passos lentos quando o assunto é criar formas de se defenderem dessas situações, principalmente porque a maioria não se conscientizou de que seu capital está nos documentos que são repassados por meios eletrônicos. “Esse é o grande valor agregado das empresas atualmente”, diz Sasson, lembrando que há dois tipos de instrumentos que poderiam impedir desgastes das empresas com a Justiça: a criação de cláusulas nos contratos de trabalho e políticas internas para a utilização das mídias sociais. O passo seguinte, segundo ele, seria criar sistemas de monitoramento, para acompanhar o uso desses instrumentos. “Mas o colaborador precisa saber, porque ninguém pode ser espionado”, ressalta.
Política interna
A Locaweb estava formalizando uma política interna de orientação para o uso do ambiente virtual quando ocorreu o fato com Glikas. “Acreditamos que uma política clara, aliada a um compartilhamento adequado com as pessoas, que seja construtiva e educativa, reforçando os valores corporativos, possivelmente ajude os colaboradores a terem uma visão melhor sobre como interagir online de uma maneira madura e profissional”, diz Mazzolla.
O gerente de Comunicação diz que, apesar do ocorrido, a Locaweb continuará a utilizar as mídias e as redes sociais como ferramentas para interagir com os clientes e para uso interno. Ele lembra que as mídias sociais permitem uma maior interação entre os funcionários e suas redes de colegas, trazendo novas idéias, acompanhando o pulso do mercado e abrindo novos canais de comunicação com o cliente. “A Locaweb, por ser uma empresa de internet, jovem e moderna, sempre encorajou seus funcionários a utilizar as redes sociais com bom senso e respeito e acredita que a participação da marca nas redes sociais é de extrema importância.”
Apesar da grande utilização da internet pelos brasileiros (67,5 milhões de usuários, segundo pesquisa Ibope/Nielsen divulgada em dezembro), levantamento da manPower com 34 mil profissionais em 35 países mostra que 55% das empresas brasileiras têm alguma política para restringir o uso das mídias sociais pelos colaboradores.
O número do levantamento, divulgado no início de 2010, é significativo quando comparado à média mundial de 20%. Isso quer dizer que a realidade de uso dessas ferramentas pelos colaboradores da Locaweb é privilégio de poucos.
Contudo, é compreensível que uma parcela considerável das corporações limitem o uso das mídias sociais porque utilizar a plataforma de acesso à internet pode trazer problemas técnicos às empresas, lembra Fábio Tadashi, gerente de RH da operadora Vivo, que libera sua rede para que os colaboradores utilizem mídias sociais (Orkut e Facebook ainda não são acessados, também por questões técnicas, mas já há projeto interno para liberá-los em um futuro próximo).
Segundo ele, para empresas do setor de tecnologia, e que tenham colaboradores com faixa etária jovem, liberar o uso de ferramentas virtuais é mais prático. No caso da Vivo, por ser uma operadora de telefonia celular, parcela considerável dos seus profissionais têm aparelhos que permitem acesso às redes e mídias sociais, como os Smartphones, o que dispensa o uso dessas ferramentas pela plataforma da empresa, mas ninguém é impedido de utilizá-la. O RH até usa o Linnkedin para buscar e contratar profissionais. "Temos encontrado colaboradores com excelentes currículos por essa ferramenta”, revela Katima Minzuni, analista de Recursos Humanos da corporação.
Desde 2008, a operadora vem discutindo internamente seus valores como empresa, e percebendo que seu negócio é conectar pessoas e não apenas vender pulsos. Esse contexto de mudanças corporativas fez com que a empresa se conscientizasse da importância do uso dessas ferramentas e desenvolvesse um planejamento para potencializar esses canais de contato com todos, inclusive criando um comitê com profissionais de vários departamentos, que se reúne mensalmente, para criar estratégias para as mídias.
A Vivo está há menos de um ano consolidando uma política interna de uso das mídias, com a construção de um pequeno manual para nortear seus colaboradores. “Estamos realizando um trabalho para criar uma cultura de responsabilidade e maturidade das pessoas ao utilizarem as mídias, para que percebam os riscos que uma empresa corre ao disponibilizar certas informações”, diz Tadashi. Mesmo sem uma política consolidada, o trabalho interno do RH vem funcionando; nunca houve na empresa um caso como o da Locaweb, segundo o executivo.
A implantação de uma política interna para o assunto pode ser a saída, mas há quem acompanha o ambiente corporativo e duvide que rígidas determinações possam ser suficientes para coibir o mau uso das mídias sociais, principalmente porque as gerações mais novas não entendem as regras da mesma forma que as gerações mais velhas.
Para a consultora Eline Kullock, presidente do Grupo Foco, o momento histórico faz as pessoas confundirem a noção de ambiente, sem saber se estão aqui ou lá, principalmente quando usam uma ferramenta virtual. Ou seja, ao postarem algo no twitter para um amigo, esquece-se que não é apenas o conhecido que vai ler, mas o mundo inteiro. “Todos esses profissionais, como o da Locaweb, não são burros e sabem o que podem dizer ou não, e criam essas situações constrangedoras porque não têm consciência do limite de lugar onde estão e suas consequências.”
Ela acrescenta que as empresas deveriam realizar um trabalho de discussão profunda sobre as mídias, e não somente determinar o limite de uso, sem permitir uma discussão do mundo atual e todas as suas possibilidades. “Falta consciência do limite de existência do outro.”
Eis algumas dicas da consultora Eline Kullock para corporações e colaboradores ficarem alertas sobre o comportamento em relação à sua utilização:
Empresa
- Oriente os colaboradores sobre exposição em demasia nas mídias sociais.
- Estabeleça critérios de utilização dessas ferramentas, denominando porta-vozes.
- Crie e mantenha canal aberto para dúvidas para todo tipo de comunicação realizada pelos colaboradores.
- Lembre a todos da necessidade de ser profissional em quaisquer posicionamentos, seja em relação à internet ou a outros veículos.
Colaborador
- Avalie sua opinião no mercado e na empresa antes de postar qualquer declaração; quanto mais alto o cargo, maior a responsabilidade.
- Conscientize-se sobre quem ou o que deverá ser atingido com seus posicionamentos; chefes, subordinados ou clientes podem ler o que você postou.
- Pense que internet é ambiente público e a repercussão é rápida e abrangente;
- Não se comprometa com assuntos que não são de sua responsabilidade; há razões para a empresa ter porta-voz.
- Pense no futuro e como suas opiniões poderão impactar sua profissão.
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